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Livro sobre a física do cotidiano

Pressão do ar dentro de um avião

Quando descemos ou subimos uma serra ou uma montanha de carro, sentimos algum desconforto nos ouvidos, ou até mesmo alguma dor. A origem disso está relacionada com a diferença da pressão do ar entre a parte interna e a parte externa do nosso ouvido. Essa diferença de pressão estica a membrana timpânica e causa aquelas sensações desagradáveis.


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A diferença de pressão ocorre porque, como a pressão externa varia rapidamente e nosso corpo não tem tempo suficiente para ajustar a pressão interna, coisa que demora alguns ou muitos minutos. Essa demora para a adaptação é maior quando a pressão externa aumenta com o tempo, como quando descemos uma serra. (Por sinal, o tempo para que a pressão do ar dentro do ouvido [1] iguale a pressão externa é maior em crianças pequenas do que em adultos; por isso é frequente elas se incomodarem mais do que os adultos e mesmo, chorarem. Mães e pais, que estão sentindo menor desconforto ou dor, ou mesmo não sentindo nada, ficam sem entender a razão do choro!).
Esse desconforto ocorre, também, quando aviões sobem e descem. Neste caso, o que acontece é o seguinte. Aviões comerciais sobem até cerca de 10 mil metros de altitude (em relação ao nível do mar) e não raramente até 12 mil metros. A essas altitudes, a pressão externa do ar é da ordem da quarta parte da pressão atmosférica ao nível do mar. Para evitar que a pressão dentro do avião não seja assim tão baixa, o que seria intolerável para as pessoas, as cabines são pressurizadas, ou seja, a pressão interna é mantida em um valor maior do que a pressão externa. Entretanto, essa pressão dentro dos aviões não é igual nem à pressão local do ponto de saída, nem à pressão local do ponto de chegada nem à pressão atmosférica no nível do mar. Segundo pilotos e informações de sítios da internet, a pressão dentro dos aviões comerciais é igual àquela da atmosfera a uma altitude de aproximadamente 2.400 m (alguns aviões, para conforto dos passageiros, mantêm pressões internas maiores do que essa, mas vamos continuar usando esse valor de 2.400 metros, bastante típico para a maioria dos aviões comerciais). Para manter essa pressão do ar dentro das cabines, os aviões têm compressores de ar, válvulas e outros equipamentos, além dos instrumentos de medida e controle.
Pois bem, quando o avião decola de uma cidade que está a uma altitude menor do que 2.400 metros, a pressão interna começa a ser reduzida paulatinamente. Quando o avião atinge a altitude de cruzeiro, a pressão interna estará reduzida e permanecerá fixa até o início da descida. Quando um avião desce, ocorre o inverso: a pressão interna vai aumentando até atingir a pressão externa local antes de abrir as portas.

Para que o desconforto dos passageiros não seja muito grande – apenas problemas temporários de audição e alguma dor passageira nos ouvidos – a variação – aumento ou diminuição – da pressão interna de um avião não ocorreu de forma muito rápida. Normalmente, a pressão interna em um avião varia a uma taxa correspondente àquela que encontraríamos se variássemos nossa altitude de 150 m a cada minuto. Essa taxa de variação da pressão é maior do que aquela que enfrentamos quando subimos ou descemos uma serra ou uma montanha de carro; neste caso, a variação de altitude é da ordem de algumas dezenas de metros a cada minuto, menor do que os 150 m por minuto dos aviões. (Você pode fazer a conta usando informações sobre viagens que tenha feito às montanhas ou ao litoral.)
Mesmo em elevadores, podemos ter alguma sensação auditiva por causa da variação da pressão externa. Um elevador comum sobe ou desce a uma velocidade de aproximadamente um andar a cada três ou quatro segundos, ou cerca de 60 metros por minuto. Essa velocidade e o tempo que somos submetidos a ela são relativamente pequenos e dificilmente percebemos alguma coisa. Mas se o número de andares for muito grande ou o elevador for muito rápido, como ocorre em edifícios altos, podemos sentir alguma sensação nos ouvidos.
Como medir a variação da pressão do ar? Se você tiver uma dessas parafernálias eletrônicas modernas, poderá medir a pressão do ar durante todo o tempo que estiver subindo ou descendo uma serra ou estiver em um avião Mas se você não tem tal parafernália, há uma maneira prática de estimar a variação da pressão. Quando você for descer uma serra, pegue uma garrafa de água de plástico, vazia, e abra-a antes de começar a viagem para que a pressão do ar dentro dela seja igualada à pressão exterior. Em seguida, feche-a bem. Quando chegar embaixo, a garrafa estará murcha, tão mais murcha quanto maior for a diferença de pressão entre o início e o fim da viagem. O quanto a garrafa murchou depende de quanto variou a pressão.
Embora essa técnica não seja muito precisa, ela é suficiente para que possamos perceber a variação da pressão em alguns casos e é bem mais interessante do que apenas ler o mostrador de um barômetro.

Medindo a pressão dentro de um avião

Uma experiência assim foi feita em uma viagem de avião. Uma garrafa de água de plástico, vazia, foi aberta quando o avião já havia atingido sua altitude máxima e a pressão interna já estava fixada. Em seguida, ela foi fechada. O destino final era uma cidade litorânea, a uma altitude de alguns poucos metros e com uma pressão atmosférica local praticamente igual à uma atmosfera. Assim, a garrafa murchou – como aquela da fotografia 1. Mas quanto ela murchou e o que isso tem a ver com a variação de pressão?

Essa garrafa estava normal quando o avião estava no alto. Quando o avião pousou e a pressão interna foi igualada à pressão externa - no caso, à pressão no nível do mar - a garrafa "murchou"

A equação de estado dos gases ideais (e para fins práticos, o ar atmosférico pode ser considerado um gás ideal) é P•V= n•R•T, onde P, V, T e n são, respectivamente, a pressão do gás, o volume ocupado por ele, sua temperatura (em kelvins) e o número de moles do gás. R é a constante dos gases perfeitos. Pois bem, se dentro do avião, no alto, e fora dele, no chão, não houver grande diferença de temperatura, então o produto P•V nos dois casos deve ser praticamente o mesmo:



Quando no alto e no avião, o volume da garrafa era igual ao seu volume normal; vamos chamá-lo de V¬. No solo, o volume da garrafa estava reduzido, pois ela murchara; vamos chamar esse volume de a•V, onde a é o fator de redução do volume. Usando essas duas últimas informações na equação acima, temos:


Conclusão: a variação relativa do volume é igual à variação relativa da pressão no avião e no solo. Por exemplo, se o volume da garrafa foi reduzido em 10% (a=0,9) desde que o avião estava no alto até abrir a porta, no solo, então a pressão no alto era de 0,9 vezes a pressão no solo. Assim, se tivermos como medir a redução do volume da garrafa, ou seja, o fator a, temos como saber a pressão dentro do avião.
Medir a redução do volume da garrafa não foi tarefa difícil. No solo, a garrafa foi mergulhada inteiramente em uma pia cheia de água e, então, aberta. Assim, água entrou na garrafa e ela voltou a sua forma original. Medindo a quantidade de água que entrou na garrafa, podemos saber a redução do volume. A figura 2 mostra como ficou a garrafa do experimento realizado depois que, dentro d`agua, voltou à sua forma original.


A garrafa murchada foi completamente mergulhada na água e aberta. Na medida em que a água entrava na garrafa, ela voltava à sua forma original.

A quantidade de água que entrou na garrafa foi estimada, na experiência feita, como sendo da ordem de 25% de seu volume; ou seja, seu volume foi reduzido por um fator 0,75. Portanto, a pressão dentro do avião era de 0,75 vezes a pressão no solo. Como o solo era uma cidade à beira mar, cuja altitude é muito pequena, podemos concluir que a pressão dentro do avião era igual a 0,75 da pressão atmosférica.

A que altitude essa pressão corresponde?

A pressão atmosférica depende da altitude do local onde estamos. Grosso modo, a pressão a uma altitude y se relaciona à pressão no nível do mar por


Assim, se no experimento realizado a pressão dentro do avião era de 0,75 vezes a pressão no nível do mar, essa última equação indica que y era, arredondando, 2.300 m.
De qualquer forma, como sítios da internet dizem que a pressão dentro de um avião comercial é igual – ou bem próxima – daquela que encontramos em um local a 2.400 metros acima do nível do mar e o nosso resultado deu 2.330 m, parece que o barômetro feito com uma embalagem de água mineral não é nada ruim.
    Claro que a experiência pode ser feita mesmo quando o destino é uma cidade acima do nível do mar. E se a diferença de temperatura interna – no avião e no alto – e no solo for muito grande, pode valer a pena fazer as contas levando-a em consideração.


[1] Sempre que decoramos as regras da língua portuguesa ou os nomes dos ossos do corpo, algum egrégio conselho de sábios muda tudo. Isso aconteceu também com o ouvido, que passa a ser chamado de orelha na nova nomenclatura dos termos médicos.


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